TABACO SÓCRATES
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Eu sou a favor da democracia e do pluralismo numa sociedade. Acho que o totalitarismo é uma coisa má. Peço desculpa. Estou envergonhado pelo que acabei de escrever;isto de ser à favor da democracia e do pluralismo é algo que está fora de moda e não se enquadra nas sociedades modernas do nosso tempo, que, aparentemente são “pós-modernas e pós democráticas”.
Dissidente-x a purgar-se de forma irónica.
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Vivemos num tempo em que somos obrigados a considerar várias opções relativamente aos nossos gostos. Vivemos num tempo em que os prazeres pessoais ou de grupo são rigorosamente escrutinados e observados. Vivemos num tempo em que os prazeres são catalogados.
Como parece que tudo se passa assim, perante a passividade geral, aos prazeres são aplicadas categorias classificativas e juízos de valor.
Um prazer é bom ou mau de acordo com essas estranhas categorias.
Quem as criou? Mistério. Mas elas existem e condicionam a vida das pessoas.
Os prazeres são assim classificados e organizados. E são proibidos e incentivados a serem proibidos, ou, no mínimo a fazer-se sentir, por lei ou pelo costume, um enorme desconforto a uma pessoa. Ou grupos de pessoas.
Somos todos obrigados a ser felizes, e somos todos incentivados a evitar cometer excessos de prazer que, por esta lógica, nos levarão a uma situação em que tudo é proibido.
Não se pode porque, caso se possa será um excesso.
Em consequência desta tendência, prazeres aparentemente ou realmente inocentes e prazeres aparentemente ou realmente menos danosos estão a ser demonizados e os que deles usufruem estão a ser atacados e hostilizados, tratados como pessoas com doenças contagiosas.
Os que bebem álcool, os que fazem sexo, os que comem gordura, os que não fazem exercício físico, os que não sorriem e não estão sempre bem dispostos, os que não consomem ou adquirem bens materiais são pessoas que devem ser hostilizadas.
Não se pode fazer nada, comer nada, desfrutar de nada. Portanto o hedonismo (a busca do prazer individual) actual combina a busca incessante do prazer com a aplicação incessante da restrição.
Tomemos o exemplo do consumo: somos incentivados a consumir à louca, mas seremos fortemente penalizados nos cartões de crédito se excedermos os limites que neles temos, embora o mesmo mecanismo nos continue a deixar consumir, sem parar o processo. ( Pelo menos até quase ao fim deste processo…)
Já não se trata da velha noção, inspirada na ética ocidental cristã, que se podia observar na frase “tudo tem a medida justa” ou na frase ” com a conta certa”.
Agora, já não existe medida justa ou certa – foi demitida das suas funções – mas sim indicações acerca do que se deve fazer para evitar cometer enormes pecados, do que se deve evitar a todo o custo, na busca de uma ideia absolutamente ilusória de um homem perfeito. A ideia do homem perfeito vem do totalitarismo especialmente o de origem alemã com o seu cortejo de heróis viris e cheios de intenções de busca da glória pelo uso do confronto com outros.
Mas é um totalitarismo muito especial.
Paradoxal.
Aquilo ( actualmente) que causa o dano deverá ser aquilo que origina a cura do dano.
Visto de uma forma mais ampla e alargada o desastre que constitui este tipo de atitude e pensamentos está no facto de os verdadeiros maus prazeres praticados de forma irrestrita, como o consumo de drogas duras, para dar um exemplo, sejam apresentados às pessoas como relativamente banalizados e não muito perigosos, enquanto que, ao mesmo tempo, constantemente se demonizam prazeres como a comida, o sexo, o sedentarismo, etc.
É aliás isso que explica que existam ataques constantes a fumadores e subsídios a pessoas que tomam drogas. Entre muitos outros exemplos…
A ausência real de lei, e de um sentido lógico da mesma está a universalizar a proibição de prazeres suaves e relativamente inócuos, quando comparados com os verdadeiros prazeres irrestritos que estão a ser “deixados à solta” – “liberalizados – e relativamente pouco perseguidos.
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Para baixar o nível deste artigo, tomemos o exemplo do senhor José Sócrates. A sua mera existência é um prazer irrestrito da pior espécie semelhante aos estragos que a heroína ou a cocaína podem fazer, e no entanto, apenas é censurado pelo facto de fumar.
É um prazer irrestrito da pior espécie e não é censurado – por exemplo – por não cumprir uma lei que ele próprio assinou – coitado, estava distraido e não percebeu que assinou uma lei que proibe o tabaco – mas sim por pedir desculpas e prometer ir deixar de fumar.
Um homem adulto a pedir desculpas por fumar e a dizer que irá deixar de fumar doravante é – realmente – uma figura patética.
Mas é uma figura que nos deverá alertar para os perigos do totalitarismo que descrevo acima, o totalitarismo que se infiltra na sociedade, pretendendo ser a cura para os males que ele próprio provoca, o totalitarismo que pretende ser o antídoto para o totalitarismo.
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