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NOVOS CÃES DE GUARDA. SERGE HALIMI. Jornalismo.

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Titulo: “Os novos cães de guarda”

Autor: Serge Halimi, jornalista do Le Monde Diplomatique.

Editora: Celta editores

Publicado em 1998 com o preço de 8 euros. Contudo em feiras do livro ou no Mercado da Ribeira do livro usado, pode-se ainda encontrar a 1 ou 2 euros. Não é dinheiro desperdiçado gastar 1 ou 2 euros neste livro.

Tema: o jornalismo e a sua subversão ao serviço da ideologia. Feita por grupos económicos, donos de meios de comunicação. E de como assim fazem propaganda em proveito próprio – agradável a si mesmo e de como os jornalistas de topo se prestam e se vendem a isso.

O livro começa com uma citação do filósofo Paul Nizan:

“Não aceitaremos eternamente que o respeito consagrado à mascara dos filósofos acabe por servir apenas para reforçar o poder dos banqueiros.”

HALIMI1

O livro apresenta no fim um índice remissivo bastante extenso para artigos de jornal, emissões radiofónicas, datas, edições de outros livros que servem de prova e como comprovativo daquilo que o autor afirma – à data da feitura do livro.

A citação de Paul Nizan e o título do livro de Halimi derivam de um ensaio que o filosofo Paul Nizan escreveu e publicou em 1932. O ensaio era um recado destinado a um outro filosofo do seu tempo que “pretenderia dissimular sob um punhado de conceitos grandiloquentes a sua participação na actualidade impura do seu tempo” – página 1 da introdução. Partindo daqui, Halimi descreve que: “ os simuladores dos nossos dias dispõem de um microfone e de uma câmara para falarem de cátedra”.

São “encenadores da realidade social e política, interna e externa, deformam-na continuamente. Servem os interesses dos senhores do mundo .São os novos cães de guarda. No entanto proclamam-se contra poder… Página 1

Halimi continua ao longo dos capítulos, explicando como o contra poder( isto é a imprensa) na realidade se desvaneceu tornando-se a favor do poder, e de como deixou de ser contra poder para fazer fretes ao verdadeiro poder, ou tornar-se parte do poder. A técnica de escrita é “completamente nervosa”, quase panfletária com imensos pormenores e comparações. Halimi demonstra que, os jornalistas, pelo menos na França da época em que o livro foi escrito estavam, na realidade, ao serviço de grupos económicos – grupos esses que tendo um core business diferente, tem, também, jornais e televisões. Logo influem directamente sobre o que é publicado. Isto porque a informação – segundo este conceito anti democrático – deixou de ser informação e passou a ser um produto como qualquer outro, logo susceptível a truques de mercado e a promoções. O jornalista segundo Halimi dispõe de pouco mais poder que uma caixa de supermercado sobre aquilo que produz, sobre o produto que fornece. São as estratégias do seu empregador – mesmo que essas estratégias estejam contra a democracia, que valem.

Não o acto puro do jornalista em informar; em fazer jornalismo “puro”.

Halimi descreve o processo. Nós cá em Portugal conhecemos bem isto.

Dá o exemplo na página 13, de Jean Marie Cavada, jornalista que além de ser responsável pelo programa politico semanal da France 3 (à época) e por uma crónica filosófica, na France Inter acaba de ser nomeado também presidente de um novo canal educativo. Halimi ironiza acerca de Cavada, quando este entrevista Jaques Chirac , um candidato que tinha sido previamente ostracizado pelos média… cito: “senhor de tantos talentos” (filosofo, jornalista, educador, produtor) JM Cavada não hesita e faz a pergunta que todos esperam “quantas variedades de maças seria capaz de me recitar ,Sr chirac”.

Isto à propósito da candidatura de Chirac a presidente.

Profundo, Arrebatador, estrondoso.

Halimi descreve também, no livro, todo o ambiente de auto censura das vedetas jornalísticas francesas, de como se tentam fazer candidatos, e puxar por esses mesmos candidatos, mesmo que as sondagens nada dêem de relevante a favor desses candidatos, e de como esta imprensa corrupta e dócil muda rapidamente de tom, quando isso se percebe e o publico/eleitores não passa qualquer tipo de importância a um candidato – Halimi explica como tudo isto se faz…etc.

Explica por exemplo, as omissões da imprensa de referencia, que não conseguiu ver e noticiar que Mitterrand, tinha uma filha ilegítima, que Mitterrand tinha cancro e ocultou isso desde o seu primeiro mandato. De como ia todas as semanas conferenciar com um ex conhecido pessoal dos tempos da republica de Vichy a casa deste, um torcionário da pior espécie. (Cá eu Portugal tivemos Sampaio e os seus problemas de coração e penso que temos Cavaco com Alzheimer ou lá perto…não podemos afastar-nos da Europa e dos métodos que esta segue…)

O livro explica também toda a mistificação à propósito da aprovação /ratificação do tratado de Maastricht, de como toda a imprensa se pós por detrás da aprovação do tratado. Halimi explica – com dados – que em numerosos debates sobre a aprovação do tratado existiam, por exemplo, dois jornalistas a debater, mas eram ambos a favor do SIM tratado. Tudo isto é apresentado como sendo profundamente democrático, claro….

Os adeptos do NÃO a Maastricht, mesmo que fossem democratas de pura gema, eram sempre apresentados como perigosos radicais esquerdistas ou outra coisa pejorativa qualquer.

Explica também a forma como a reverencia jornalística ao dinheiro se processa, com artigos inflamados e opiniões favoráveis a magnatas da imprensa ou da industria. Depois descreve situações em que, por exemplo, existe um qualquer caso de corrupção que é apenas noticiado em 10 segundos sendo depois submergido num mar de noticias banais. Assim toda a gente esquece. Depressa. Em Portugal exemplo; caso Casa Pia, que apesar de não ser um caso económico, continua a ser julgado, mas desapareceu misteriosamente das noticias.

Explica ainda o pensamento único e a técnica dos jornalistas para o servirem. Claro que ao nível da maior estupidez. Um exemplo – página 46 Cito: ” os atletas nacionais obtêm maus resultados nos jogos olímpicos de Inverno? Olivier Mazerrole, director de informação da RTL ,sugere uma explicação inesperada: “os franceses não são bons desportistas porque temos o hábito do estado providencia”.

Cito também uma frase da página 53 de Halimi, que cita outra vez Paul Nizan: “O Sr Michelin tem de fazer crer que só fabrica pneus para dar trabalho a operários que, sem ele, morreriam de fome”.

Isto para levar à demonstração de como a colonização ideológica das rubricas económicas nos jornais (estava) está em movimento. A técnica é muito simples.

Existe o liberalismo, que é o presente (apresentado como tal) e existem os arcaísmos, (apresentados como tal) que são as condições sociais, o estado social.

Halimi dá ainda inúmeros exemplos de jornalistas a proferirem teorias destas, completamente neoliberais e mais ainda a auto glorificarem-se como sendo “pessoas que vão contra a corrente” e que são ousadas …A técnica é simples:

Modernidade.

 

  1. comercio livre,
  2. moeda forte,
  3. privatizações,
  4. desregulamentações,
  5. Europa.

 

Arcaísmo:

 

  1. Estado providencia,
  2. sindicatos ( porque são corporativos – por oposição ás associações patronais que não são corporativas…),
  3. nação ( nacionalista),
  4. sector publico ( monopólio)
  5. e povo ( demasiado populista).

Halimi escreve ainda que foi a confluência ideológica da esquerda e da direita que levou às desregulamentações e privatizações e que isto, sobre o caso especifico do jornalismo levou a uma barragem ideológica feita pelos principais jornalistas /jornais para promover isso mesmo.

Também explica como se manipulam os cidadãos relativamente a conflitos sociais. Exemplo: uma qualquer greve/ conflito que aconteça. Quando não existem greves e coisas do mesmo estilo raramente vemos noticias sobre desempregados e sobre as dificuldades que estes passam. Quando existem greves – de repente – os sem abrigo e as preocupações com as pessoas que tem dificuldades em chegar ao emprego saltam para as primeiras páginas dos jornais.

À pagina 83 do livro surge Bernard henry Levi ou BHL..

Actualmente (2006) BHL escreveu uma treta qualquer em que, pedante e medíocre como é, tentou recriar a viagem que Alexis de Tocqueville fez há 200 anos pela América da qual resultou o livro “Democracia na América”. BHL peneirento e auto promovendo-se, não faz por menos e fez o mesmo. Mas convenhamos: BHL não é nenhum Tocqueville.

Mas já em 1992, para dar um exemplo, BHL e o jornalismo de sarjeta ridículo andavam de mãos dadas. Na altura o tema do momento era a Bósnia. BHL explora sempre os temas do momento para demonstrar a vacuidade do que lhe sai para fora – BHL explora o filão que esteja a dar.

Transmutou-se de cineasta fazendo um filme chamado Bosna. Paralelamente, para gerar o que actualmente se chama marketing viral ou “Buzz”, mas naquela se chamava “ocupar mais do que um canal de distribuição”, o nosso BHL fez aquilo que os liberais estilo blog blasfémias cá da paróquia nunca terão coragem de fazer: lançar um pseudo movimento politico. Cria uma coisa chamada “Movimento Sarajevo”. Conhecido por lista Sarajevo…para concorrer à eleições e “dar uma volta nisto”( sendo isto a notoriedade de BHL e a sua conta bancária)

Halimi descasca isto tudo.

Conta Halimi, que um jornalista ( François henry de Virieu) aconselha em directo as pessoas a irem ver o filme. No programa politico da France 2. Halimi goza e passo a citar ”… recém chegado( BHL) do festival de Cannes, profetiza: “ o cimento social está a abrir brechas”. Isto a 15 de Maio de 1994.

No mesmo dia às 19 horas, a 3 cabeças de lista às eleições europeias no programa 7 sur 7, é-lhes pedido que comentem (por Anne Sinclair – jornalista…) algumas imagens do filme Bosna.( De BHL)

O filme é comparado a “l`espoir de André Malraux.. Como diz Halimi ” o 7 sur 7 acha que é preciso ir vê-lo”. Depois anuncia a existência da tal lista Sarajevo – qualificada de “lista dos intelectuais”.Deus nos salve desta gente, escrevo eu, e nem sequer acredito em Deus… O mais espantoso é que numerosos intelectuais tinham tomado posição contra a iniciativa…. Halimi diz que o nome da revista “regle du jeu” dirigida por BHL foi citada umas centenas de vezes nesse programa.

No dia 16 Maio de 1994 – dia seguinte, BHL é convidado duma única estação – France inter e em quatro programas diferentes…é o centro das atenções.

Ao dia 19 de Maio, Laurent Jofrin, chefe então do Nouvel observateur considera que BHL “ renova a maneira de praticar a politica, obrigando o Estado e a politica a mudar.”E acrescenta que “ é precisamente para este tipo de correntes que a esquerda deve orientar-se”..HALIMI2

Dois dias depois a 21de Maio de 1994, uma jornalista chamada Catherine Pegard não esconde a admiração falando do êxito do filme Bosna, no seu programa hora da verdade cito “ o escritor marca o despertar de uma certa consciência europeia”

Pergunto: alguém a viu por aí? ( A consciência…)

Cito de novo Halimi: “A 29 de Maio, no 7 sur 7, apesar de algumas sondagens não atribuírem mais de 4% de votos à lista Sarajevo ( que obterá sem o apoio de BHL, 1.56), a jornalista Anne Sinclair anuncia ”a lista dos intelectuais altera profundamente os dados eleitorais, altera o panorama das eleições europeias”

Passemos adiante para Novembro de 1994 – BHL, como a teta da vaca chamada Bósnia, já não estava a dar, vira-se para o integrismo e lança um ensaio. Halimi explica que volta a merecer um “tratamento mediático generoso”

7 sur 7, clube de imprensa da Europe 1, primeira pagina do Le monde. Em 1997 é a apoteose, quando sai o seu segundo filme “La jour e la nuit. – co – produzido pela televisão publica e por Jean Luc lagardere ( o tipo, à época, dono da Matra racing e de uma empresa de armamento francesa, creio que a Thompson…actual Thales-thompson, salvo erro) …primeiras páginas do Le point, Paris Match, Le Fígaro, Evenemeunt de Jeudi, Figaro, Da madame fígaro. Os do Nouvelle Observateur já vários meses antes tinham sido alertados para a gestação da obra.. Pelo meio BHL que tinha um programa/coluna de jornal ou lá o que é… chamado “Bloc de notes semanal onde também se propagandeava a si mesmo.

Já no magazine l`express, pode-se encontrar na revista uma dupla pagina intitulada” as notas de rodagem de BHL. Autor: o próprio BHL…

Apesar desta barragem de propaganda acerca do “ Grande filosofo” , o publico que não vai em grupos, devota total indiferença à magnifica obra de BHL

Halimi nota que apesar de tudo os críticos de cinema, não foram em cantigas e desancaram a obra. O senhor filósofo fica amargurado e no seu bloc de notes escreve amargurado ”fim do reinado do dinheiro louco”. Já agora, a brincadeira BHL – o filme custou 53 milhões de francos – custeados pelos Estado francês e pelo empresário privado saiu mesmo cara..

E a partir daqui Halimi explica como existem lugares privatizados mediáticos arranjados – de facto – para os BHL´s de França e de como 540 mediocratas decidem sobre a vida e a morte de 40 mil autores de livros com as suas criticas arrasadoras ou não.

Portanto é de ler para ser ter uma ideia do que é o jornalismo actual.Ali está a génese da coisa.

Written by dissidentex

07/12/2007 às 14:55

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